terça-feira, 10 de abril de 2018

sobre viver com dor física

Isto da dor é muito relativo. É difícil medi-la com exactidão, já que a sensibilidade ou a resistência variam de pessoa para pessoa. É daquelas coisas: uma topada no mindinho do pé e parece que a alma me sobe pela garganta... mas removi os dentes do siso sem problemas. Quando me perguntam «de zero a dez, como classificaria determinada dor», penso que esta será possivelmente uma das perguntas mais parvas que se pode colocar a alguém, já que o meu nove na escala da dor pode ser o cinco na escala da dor da minha mãe.

A verdade é que não sou de me queixar e só nas últimas é que me lamento - quando não aguento mesmo mais. Evito medicar-me, acredito que o meu corpo supera tudo. Não gosto de perder tempo com médicos nem com idas a hospitais porque tento sempre que o veterinário que tenho como pai me solucione os problemas de saúde com que vou lidando. 

Aos catorze anos foi-me diagnosticado um tipo de reumatismo. Não fiquei muito chateada, já que a minha avó teve o infortúnio de começar a viver com isto aos dez. Quanto a mim, começou nos membros superiores e durante a faculdade senti-o chegar também aos joelhos. 

Quando me via em pose de Tiranossauro, a tentar retirar os pratos da prateleira para depois os colocar sobre a mesa, o meu pai percebia que estava aflita com dores. Como disse, não sou de me queixar, no entanto, às vezes começo o dia com lágrimas porque a dor que me acorda é insuportável e não consigo esticar os braços. Tenho a sensação de que vou ficar presa na posição em que estou para todo o sempre, que tentar qualquer movimento é excessivamente doloroso.

Lembro-me da primeira vez que percebi que essa dor queria condicionar também as minhas pernas. Estava no cinema, com o meu namorado, quando a meio do filme entrei em pânico. Não conseguia mexer os membros inferiores, uma dor aguda nos joelhos a cada tentativa de o fazer. Já repararam que o ar condicionado está sempre ligado no cinema? Está sempre frio - demasiado, para mim. Ir ver um filme implica estar constantemente a trocar de posição para evitar que esse momento chegue, uma vez que enquanto me mexo, não dói tanto. 

Nas aulas de Educação Física, de que nunca fui fã, os professores não acreditavam em mim. Invariavelmente, julgavam tratar-se de uma desculpa ridícula de uma aluna preguiçosa. Quando conto a alguém que tenho reumatismo, sem entrar em detalhes, ninguém acredita. Por ser detentora de um sentido de humor característico, toda a gente se ri. Aparentemente, sou uma jovem mulher sem dedos deformados, por isso não faz sentido. Mexo-me normalmente, portanto seria absurdo ter reumatismo, essa doença dos velhinhos que não conseguem andar direitos. Como não me queixo, não me lamento e não me vitimizo, não parece nada sério.

Mas é.

Limita-me. 

- E não há tratamento?

Não. Há anti-inflamatórios, que podem amenizar a situação e atrasar a evolução mas não me curam. 
Dói, limita, cansa. A conduzir, na praia, em casa, num restaurante com amigos, no trabalho. Sempre. No frio ou no calor, pode doer. E sabem o que se faz? Nada. Respira-se fundo e continua-se a viver. 

É por viver com isto desde miúda e não me lamuriar que não compreendo bem quando certas doenças que implicam dor crónica se tornam bandeiras e hashtags. Como se houvesse necessidade de dizer ao mundo «hey, tenham peninha de mim que estou aqui com dores». Para quê?

Por falar em dores, parece que agora estou com dor ciática. Estou à espera de vaga no meu osteopata, que isto são dores que não se aguenta e não há comprimido que me ajude nem álcool que me deixe insensível. Algum expert na matéria desse lado? 

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